Há algum tempo que não saia à rua tão cedo, o mais próximo disso foi no tempo em que chegava a casa quando as pessoas já madrugavam para o trabalho. Mas nessa altura era o meu prolongamento da noite, hoje foi o início do meu dia.
O frio era lancinante e encontrava a minha pele, apesar do cuidado esforçado de não deixar nada mais à mostra do que o necessário. Estava escuro e, ao passar pelo viaduto, à direita, vi o Cristo-Rei e a Ponte num céu de fundo alaranjado e azul mais claro que fazia adivinhar um dia de sol gélido.
Não se encontrava uma única pessoa na Rua Augusta. A rua que, três horas depois, estaria repleta de transeuntes, pedintes, vendedores de flores e de castanhas, de empregados de esplanada agitados e de clientes empertigados. Deu-me, subitamente, uma enorme vontade de percorrê-la em passo rápido até ao fim, dar saltos e voltinhas e fingir, por momentos, que a baixa era só minha. Mas tinha pressa e o céu começava a ficar azul claro, límpido. Fiquei-me pelo pensamento. O frio continuava a incomodar e isso fazia-me quase correr para chegar ao fim do caminho, onde sabia que ia encontrar um ar-condicionado com temperatura bem amena. Os olhos humedeceram-se devido ao frio, ou por ter passado pelo sem-abrigo a dormir à porta da igreja, enrolado em cartões e num único cobertor de padrão azul-escuro que o cobria até à cabeça. Continuo o meu caminho mas, agora, já com outro espírito. O frio continua lá, mas incomoda bem menos depois daquela imagem.
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