Uma vez, há muitos anos, ouvi uma mulher dizer para outra: "ele tem medo até da própria voz!". Até àquela altura nunca me tinha apercebido que é possível assustarmo-nos com a nossa própria voz, daí ter ficado com esta frase embutida na memória. Às vezes evoco-a e penso que sinto o mesmo que "ele". Não sempre, mas às vezes. Não é tanto pelo som da voz que quebra o silêncio do sossego em que estamos, passa mais por tornar audíveis os nossos pensamentos, por os ouvirmos com entoação, com um timbre mais grave ou mais agudo, como se fosse outra pessoa a reproduzir, com conhecimento, os nossos pensamentos. Assusta sim. Ao darmos voz aos pensamentos, estes passam a ter forma, parece que nos tornamos mais vulneráveis, com possibilidade de partilha mesmo sem intenção. Um risco que se corre. Assusta sim e também pode causar vergonha.
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