Hoje, enquanto fazia tempo para começar a aula, ia vendo rapazes e raparigas a subir e a descer os intermináveis lanços de escadas da faculdade e dava para perceber, pelas conversas, que estavam ainda no primeiro ou segundo ano. Pela primeira vez cheguei a sentir uma certa inveja deles. Geralmente, quando olho para eles, o que sinto é qualquer coisa como um certo sabor a superioridade e penso para mim que mal sabem eles o que ainda os espera. Olho para eles e conto os anos: 1, 2, 3, 4. Já estou a meio do quarto e eles ainda no princípio. E por isso, hoje, tive inveja deles. Queixo-me da quantidade de trabalhos por semestre, queixo-me porque me deixa nervosa apresentar trabalhos oralmente e tenho de o fazer constantemente, queixo-me porque me custa acordar cedo para apanhar dois autocarros para ir para as aulas, queixo-me porque as férias de três meses me parecem sempre curtas, queixo-me da quantidade de frequências, queixo-me dos professores, queixo-me das mensalidades e do número de livros que temos de comprar, queixo-me disto e daquilo. Mas hoje, só hoje, tive inveja daqueles rapazes e raparigas que desciam e subiam aquelas escadas que eu tantas vezes já subi e desci, umas vezes mais ansiosa antes dum trabalho, outras vezes com um sorriso na cara por um teste me ter corrido bem, outras vezes a conversar e a brincar com as minhas colegas que sei que vão ficar comigo toda a vida, além da faculdade. Aqueles rapazes e raparigas vão cruzar-se, tal como eu me cruzei, com professores que marcam alguém simplesmente por uma frase dita na altura certa, por uma frase que se adequa perfeitamente ao que estamos a sentir na altura e que define por palavras claras exactamente aquilo que muitas vezes sentimos sem saber como exprimir. Aqueles rapazes e raparigas vão sair, tal como eu saí, de muitas aulas com um ponto de interrogação na testa ou com um brilho nos olhos por ter aprendido nesses minutos anteriores algo que os vai acompanhar para sempre. Aquelas raparigas e aqueles rapazes, provavelmente, não sabem ainda a sorte que têm por estar ali a aprender com pessoas tão úteis e sábias. Hoje olho para trás e tenho saudades do começo, tenho pena por não ter aproveitado mais alguns recursos que estavam disponíveis e que, por preguiça ou por falta de tempo não aproveitei. Hoje tracei uma linha imaginária na minha mente e percebi que estou na pontinha do lado direito e que este é o último semestre de aulas da minha vida. É uma etapa que acaba. Vou, finalmente, exercer a profissão que escolhi. E sei que não estou preparada, que não me sinto segura, que tenho dúvidas constantes e que não vai ser fácil. Vou deixar este conforto que dá jeito, esta margem de manobra que me deixa faltar quando quero e que me permite acordar tarde e fazer os meus próprios horários e entrar num mundo que me vai obrigar a ser adulta, a ser ainda mais responsável, a enfrentar-me a mim mesma e a perceber se afinal sou ou não capaz. Hoje, desejei estar a entrar para a faculdade, pela primeira vez.
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