domingo, 16 de março de 2008

"Novos Contos da Velha Lisboa"

"(...) nem sempre me conformei com os destinos inevitáveis, mas cedo entendi que, quando uma criança nasce, o mundo é sempre do seu tamanho. Ora, o meu mundo era Lisboa; o meu país, Belém; a minha aldeia, a Travessa da Memória. E foi muito claramente assim durante toda a minha infância.
A fronteira sul do meu país era o Tejo.
Sentava-me muitas vezes no pontão de Belém, simplesmente a olhar gaivotas desaustinadas, peixes na calhandrice da babugem, namorados lânguidos com olhos de lua, cães vadios - os grandes sabedores da vida de sobrevivência - velhos marinheiros de rio, blusas de flanela desbotadas (...).
A outra margem seduzia-me. Achava deslumbrante passar de barco para o Porto Brandão, navegar nas águas inquietas do estuário até à Trafaria, enfrentando o mar com a coragem henriquina de quem chega ao novo mundo numa casquinha de noz (...)."

Vítor Serpa

(photografia por Jane)

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