(…) a criança, principalmente na fase genital infantil, precisa do olhar de alguém que confira beleza ao seu corpo; assim como o adolescente vai precisar de alguém que confirme a beleza desse seu mesmo corpo.
Todavia, antes e concomitantemente, o bebé é reconhecido e investido pelo seu rosto – que o diferencia de todos os outros bebés, confirmando-o como único e o mais belo (para e pelos seus pais, designadamente a sua mãe). É esta distinção e honra de ser único e especial que o soergue do anonimato e da indiferença, colocando-o no altar da admiração e do amor. (…)
Assim, à mingua e sem investimento narcisante e isolado que então fica do corpo erótico – desde logo, do afecto -, o bebé vai crescer, por um lado, anónimo, sem identidade valorizante, e por outro, deslibinizado, sem uma sexualidade viva e um erotismo global, que se estenda da ponta dos pêlos à medula dos ossos, difundido também por toda a mente e funções do aparelho psiquico. (…)
É somente o ser exclusivo e com um rosto apreciado e amado aquele que tem acesso, não só à identidade-diferença, como ao estatuto de alguém, a dignidade sem a qual se é apenas ninguém. Um rosto que define e distingue, um rosto que valoriza e promove – um rosto que dá unidade, coesão, equilíbrio e força à mente e ao corpo, um rosto que contém e ostenta a pessoa. Sem essa unicidade e brilho, a pessoa não existe. (…)
Ter rosto significa, então, ser amado tal como se é; ser bonito porque se é amado, e não por ter olhos azuis ou pretos. Ser alguém – e não o Zé ou a Maria Ninguém – é ser objecto de amor, o objecto construído pelo amor, e não o objecto que fabrica um amor sempre falso. (…)
E, para finalizar: só desejado por aquilo que sou posso amar-me a mim mesmo, ter um narcisimo saudável e uma auto-estima confortante.
Ter rosto é, pois, ser gente – amável e amada, distinguível e distinta: em toda a acepção da palavra. Porque qualquer um de nós tem sempre algo que o distingue, o enobrece e de que se orgulha. (…) Portanto, a beleza do bebé, o seu impacte estético na mãe/pai está no olhar idealizante destes – no bebé fantasmático e imaginário, muito mais do que no bebé real.
in Mais Amor Menos Doença
António Coimbra de Matos
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